Satélite mapeia nuvem de gás onde está o Sistema Solar
Astronomia

Satélite mapeia nuvem de gás onde está o Sistema Solar


Um observatório espacial que já deveria estar aposentado conseguiu colher informação suficiente para fazer o primeiro mapa da nuvem de gás interestelar onde o Sistema Solar se localiza.
As novas imagens, obtidas pelo satélite Ibex, sugerem que a composição química do lugar onde vivemos na galáxia tem algo de especial.
"O que nós estamos conseguindo enxergar é realmente matéria alienígena, aquela a partir da qual o Sol e tudo o mais se formou aqui na Via Láctea", disse David McComas, cientista-chefe do projeto, ao apresentar os dados ontem na sede da Nasa, em Washington.
O mapa que o cientista exibiu mostra o Sol localizado na borda da nuvem local de gás e apresenta com mais precisão seu movimento dentro da galáxia.
À medida que o Sistema Solar trafega pela Via Láctea, partículas vão colidindo com a Terra e outros objetos próximos ao Sol, e essa é a única maneira de investigar o material que circunda nossa vizinhança planetária.
O Ibex é capaz de capturar essas partículas, porque tem um detector sensível a átomos eletricamente neutros. Acredita-se que a maior parte das partículas que residem no material interestelar tenham carga elétrica, mas elas acabam expulsas pelo vento solar --os prótons e elétrons livres emitidos pelo próprio Sol-- ou formando novos átomos neutros ao colidir com ele.
Em uma série de estudos publicados ontem na revista "Astrophysics Journal", os cientistas mostram como diferentes elementos químicos se distribuem na nossa região da galáxia. Uma descoberta particularmente interessante foi a de que o Sistema Solar possui mais átomos de oxigênio do que a nuvem que o abriga.
Os cientistas concluíram isso ao comparar a proporção de oxigênio em relação ao gás neônio nas amostras obtidas.
"Isso significa, possivelmente, que o Sol nasceu dentro de um ambiente diferente daquele em que está agora", disse à Folha Priscila Frisch, astrofísica da Universidade de Chicago que coordenou um dos trabalhos publicados agora. "Na verdade, estimamos que o Sistema Solar só entrou nessa nuvem local de gás em que está agora uns 45 mil anos atrás, um tempo extremamente curto se você levar em conta que o Sol tem 4,5 bilhões de anos."
VELOCÍMETRO ALTERADO
Outra descoberta importante da Ibex apresentada pelos cientistas é que o Sistema Solar não está viajando pela galáxia a uma velocidade tão grande quanto se achava.
Uma outra sonda que tentou fazer essa medida, a Ulysses, havia estimado que o Sol trafega pela galáxia a 95 mil km/h. A Ibex fez medidas mais precisas e concluiu que essa velocidade é na verdade de 84 mil km/h.
A correção não parece grande coisa, mas ela ajuda os cientistas a entenderem melhor como o vento solar interage com a matéria intergaláctica. Se a velocidade de deslocamento do Sol fosse de fato a estimada pela Ulysses, a pressão da matéria intergaláctica criaria mais "rasgos" nas lufadas de vento solar, fazendo com que 20% mais partículas carregadas --os nocivos raios cósmicos-- entrassem no Sistema Solar.
A quantidade relativamente baixa de raios cósmicos que atinge a Terra é, aliás, um dos motivos pelos quais a vida pode florescer aqui há 3,8 bilhões de anos.
Segundo Seth Redfield, astrofísico independente que revisou os trabalhos mais recentes sobre a Ibex, diz que entender como o vento estelar interage com o material interestelar será fundamental para entender como é o ambiente planetário de outras estrelas.
"Nós já sabemos de pelo menos dois planetas fora do Sistema Solar que orbitam estrelas com astroesferas geradas por vento estelar", disse. "Se entendermos como funciona a heliosfera (a estrutura gerada pelo espalhamento de vento solar), podemos descobrir que talvez elas sejam um compontente importante para criar condições planetárias necessárias à vida. Pelo pouco que sabemos, astrosferas podem ter estruturas bastante diferentes da que temos aqui. É um verdadeiro zoológico."
Segundo os cientistas, é provável que a Ibex consiga continuar contribuindo para esses estudos. Apesar de o observatório espacial ter sido projetado para durar só de 2008 a 2010, engenheiros esperam que ele possa durar pelo menos mais uma década, agora que conseguiram colocá-lo em uma órbita estável.




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