Astronomia
"Mudança climática é questão moral", diz cientista da Nasa
Evitar as piores consequências da mudança climática provocada pelo ser humano é uma "grande questão moral" equivalente à escravidão, segundo o importante cientista climático da Nasa professor Jim Hansen.
Ele afirma que o acúmulo de consequências dispendiosas e destrutivas para a sociedade do futuro é uma "injustiça de uma geração para com as demais".
Hansen, que amanhã (10/4) receberá a prestigiosa Medalha de Edimburgo por sua contribuição à ciência, pedirá um imposto mundial sobre todas as emissões de carbono em seu discurso de aceitação.
Em sua palestra, Hansen vai argumentar que o desafio diante das futuras gerações por causa da mudança climática é tão urgente que há necessidade de um imposto fixo global para forçar cortes imediatos no uso de combustível fóssil.
Antes de receber o prêmio --que já foi dado a sir David Attenborough, ao ecologista James Lovelock e ao economista Amartya Sen--, Hansen disse ao "Guardian" que os últimos modelos climáticos mostraram que o planeta está à beira de uma emergência. Ele disse que a humanidade enfrenta repetidos desastres naturais causados por acontecimentos climáticos extremos que afetarão grandes áreas do planeta.
"A situação que estamos criando para os jovens e as futuras gerações é que lhes entregamos um sistema climático potencialmente fora de seu controle", ele disse. "Estamos em uma emergência: você pode ver o que está no horizonte para as próximas décadas, com os efeitos que terá sobre os ecossistemas, o nível do mar e a extinção de espécies."
INFLUÊNCIA Aos 70 anos, Hansen é considerado uma das figuras mais influentes na ciência climática; o criador de um dos primeiros modelos climáticos globais, seu papel pioneiro ao advertir sobre o aquecimento global foi frequentemente citado por ativistas do clima, como o ex-vice-presidente americano Al Gore, e em prêmios científicos anteriores, incluindo o prêmio Dan David, de US$ 1 milhão. Ele foi preso mais de uma vez por participar de protestos contra a energia carbonífera.
Hansen vai afirmar em sua palestra que as atuais gerações têm o enorme dever moral para com seus filhos e netos de agir imediatamente. Descrevendo-o como uma questão de justiça intergeracional, equivalente à abolição da escravidão, Hansen disse: "Nossos pais não sabiam que estavam causando um problema para as futuras gerações, mas nós só podemos fingir que não sabemos, porque a ciência hoje é cristalina.
"Nós compreendemos o ciclo do carbono: o CO2 que colocamos no ar ficará em reservatórios na superfície e não voltará para a terra sólida durante milênios. O que a história da Terra nos diz é que há um limite de quanto podemos colocar no ar sem causar consequências desastrosas para as futuras gerações. Não podemos fingir que não sabíamos."
Hansen afirmou que sua proposta de um imposto global ao carbono se baseia nas últimas análises dos níveis de CO2 na atmosfera e seu impacto sobre as temperaturas globais e os padrões climáticos. Ele é coautor de um trabalho científico com outros 17 especialistas, entre eles cientistas climáticos, biólogos e economistas, que pedem um corte anual imediato de 6% nas emissões de CO2 e um crescimento substancial na cobertura florestal global, para evitar uma mudança climática catastrófica no final deste século.
O trabalho, que foi aprovado por colegas cientistas e está nas etapas finais de publicação pelo Proceedings of the National Academy of Sciences, afirma que uma taxa global sobre os combustíveis fósseis é a ferramenta mais forte para obrigar as companhias energéticas e os consumidores a mudarem rapidamente para fontes de energia verdes e sem emissão de carbono. Em países maiores, isso incluiria a energia nuclear.
INVESTIMENTOS De acordo com essa proposta, a tarifa do carbono aumentaria ano a ano, e sua receita seria devolvida diretamente ao público como um dividendo igualmente compartilhado, e não colocada nos cofres do governo. Como o imposto aumentaria muito o custo da energia de combustíveis fósseis, os consumidores que contam com fontes de energia verdes ou de baixa emissão de carbono se beneficiariam mais, pois esse dividendo se acrescentaria às contas de combustível mais baratas.
Isto promoveria um drástico aumento do investimento em desenvolvimento de fontes energéticas e tecnologias de baixo teor de carbono.
Os muito ricos e os maiores usuários de energia, pessoas que têm várias casas, jatos particulares ou carros de alto consumo, também seriam obrigados a modificar drasticamente sua utilização da energia.
No novo trabalho, Hansen, que é diretor do Instituto Goddard de Estudos Espaciais da Nasa, e seus colegas advertem que, se não cortarmos as emissões de CO2 em 6% agora, em 2022 os cortes anuais precisarão atingir um nível mais drástico, de 15% ao ano.
Se uma ação semelhante tivesse sido tomada em 2005, quando entrou em vigor o Protocolo de Kyoto sobre mudança climática, a redução da emissão de CO2 teria sido mais administrável, de 3% ao ano. A meta era retornar aos níveis de CO2 na atmosfera de 350 partes por milhão, em comparação com seu nível atual de 392 ppm.
O trabalho, intitulado "Tese Científica para Evitar a Perigosa Mudança Climática e Proteger os Jovens e a Natureza", também afirma que o desafio está crescendo por causa da corrida acelerada para encontrar novas fontes de petróleo, gás e carvão mais difíceis de alcançar --nas profundezas oceânicas, no Ártico e nas reservas de xisto.
Hansen disse que as atuais tentativas de limitar as emissões de carbono foram "completamente ineficazes", especialmente o mecanismo de negociação de emissões da União Europeia adotado sob o Protocolo de Kyoto, que restringe quanto CO2 uma indústria pode emitir antes que tenha de pagar uma taxa por excesso de emissão.
Sob a proposta de imposto global do carbono, o mecanismo de controle do uso de combustível fóssil seria tirado das mãos de países individuais influenciados pelas empresas de energia e de políticos ansiosos para ganhar eleições.
"Não pode ser definido por mudanças individuais específicas; tem de ser uma taxa crescente e para todos sobre as emissões de carbono", disse Hansen. "Não podemos simplesmente dizer que existe um problema climático e deixá-lo a cargo dos políticos. Eles estão tão claramente sob a influência da indústria de combustíveis fósseis que apresentam soluções absurdas, que não são soluções. Essa é a conclusão final."
Tradução de
LUIZ ROBERTO MENDES GONÇALVES.
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